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Centro-esquerda renasce em eleições municipais na Itália

As eleições municipais de 2021 na Itália, realizadas entre 3 e 4 de outubro, marcaram o declínio do principal partido populista do país e tiveram vitórias categóricas da centro-esquerda, que vinha de seguidas derrotas nos últimos anos.

Se em 2016 o antissistema Movimento 5 Estrelas (M5S) havia causado furor ao conquistar Roma e Turim, primeira e quarta cidades mais populosas da Itália, desta vez a sigla populista não só perdeu as duas metrópoles, mas se deu bem apenas onde apoiou candidatos progressistas.

Das seis capitais regionais que foram às urnas (Roma, Milão, Nápoles, Turim, Bolonha e Trieste), o M5S correu com postulantes próprios em quatro, mas não chegou ao segundo turno em nenhuma delas.

Por outro lado, apoiou os candidatos de centro-esquerda eleitos em primeiro turno em Nápoles (Gaetano Manfredi) e Bolonha (Matteo Lepore), ambos com mais de 60% dos votos, mas com a apuração ainda em curso.

O campo progressista também obteve uma vitória categórica em Milão, com a reeleição do prefeito Giuseppe Sala (56%), do partido ambientalista Europa Verde, e estará no segundo turno em Roma, com o ex-ministro da Economia Roberto Gualtieri, do Partido Democrático (PD); em Turim, com o independente Stefano Lo Russo; e em Trieste, com Francesco Russo, do PD.

Gualtieri, Lo Russo e Russo enfrentarão, respectivamente, Enrico Michetti, Paolo Damilano e Roberto Dipiazza, apoiados por uma coalizão que inclui dois partidos de extrema direita (Liga, de Matteo Salvini, e Irmãos da Itália, de Giorgia Meloni) e um conservador moderado, o Força Itália, de Silvio Berlusconi.

Essa aliança governa a maioria das regiões na Itália, mas passa por um momento de crescente tensão interna por causa da ascensão de Meloni, que já ameaça inclusive a hegemonia de Salvini no campo conservador.

As três forças que compõem a coalizão tiveram dificuldades para entrar em consenso sobre seus candidatos, e o próprio Berlusconi reconheceu as divergências. “Os candidatos a prefeito foram nomeados por esse ou aquele líder de partido, e não por escolhas democráticas, então talvez seja preciso mudar o sistema”, disse o ex-premiê.

Das três capitais em que está no segundo turno, a aliança conservadora é favorita apenas em Trieste, ainda que termine o primeiro turno na frente em Roma. A coalizão de direita também deve celebrar a eleição de Roberto Occhiuto a governador da Calábria, única região que foi às urnas.

“Escolhemos os melhores candidatos possíveis, não criticarei nenhum, mas o voto pela continuidade e o não voto nos dizem que demoramos para escolhê-los”, admitiu Salvini.

Já o ex-primeiro-ministro Enrico Letta, líder do PD, afirmou que os resultados se devem à “unidade interna do partido” e à “união da centro-esquerda”. “Demonstramos que é possível derrotar a direita”, acrescentou o ex premiê, que foi eleito deputado em uma votação suplementar para preencher uma vaga de Siena na Câmara.

“Essa grande vitória do PD e da centro-esquerda reforçam a Itália e o governo. Voltamos a estar em sintonia com o país”, disse Letta.

Roma

Principal prêmio das eleições de 2021, Roma tinha uma disputa acirrada entre quatro candidatos, mas acabou prevalecendo a polarização direita-esquerda.

Segundo as projeções, Michetti terminará o primeiro turno na liderança, com pouco mais de 30% dos votos, mas todas as pesquisas para o segundo turno, entre 17 e 18 de outubro, o colocam atrás de Gualtieri, ex-ministro socialista que é fã declarado do ex-presidente Lula e de música brasileira.

“Roma pode renascer, ter um papel de destaque entre as grandes capitais europeias e guiar uma temporada de retomada do país”, declarou Gualtieri, que aparece com 26% a 27% dos votos nas projeções.

O ex-ministro do Desenvolvimento Econômico Carlo Calenda, de centro, aspirava chegar ao segundo turno como uma terceira via, mas aparece em quarto lugar, com 18% a 19% nas projeções, atrás até da impopular prefeita Virginia Raggi (entre 19% e 20%).

Expoente do M5S, Raggi é a primeira mulher a governar Roma em sua história milenar e havia sido eleita em 2016, na esteira do crescimento do populismo na Itália.

A prefeita, no entanto, teve um mandato conturbado e foi bastante criticada por não ter resolvido problemas crônicos da “cidade eterna”, como as deficiências na gestão de lixo e no sistema de transporte público.

Raggi chegou inclusive a ser processada por falso testemunho em uma investigação sobre supostas irregularidades nas nomeações para seu secretariado, mas acabou absolvida, e também foi taxada de “antivax” por adversários, por se recusar a tomar a vacina contra a Covid19 com o argumento de que tem “alto nível” de anticorpos.

Antissistema

A prefeita ainda pagou o preço da queda de popularidade do M5S, primeira força antissistema a chegar ao governo na Europa Ocidental.

Dono da maior bancada no Parlamento por causa de sua vitória nas eleições legislativas de 2018, o partido viu seu eleitorado minguar nos anos seguintes, durante as duas gestões do ex-premiê Giuseppe Conte.

Na primeira (2018-2019), o M5S afastou apoiadores progressistas ao se aliar com Salvini. Na segunda (2019 2021), se distanciou de populistas e eurocéticos ao se juntar com a centroesquerda tradicional.

Hoje o M5S ainda faz parte da base aliada do premiê Mario Draghi, um símbolo do establishment europeu que o movimento sempre criticou.

Em seu primeiro pronunciamento após o fechamento das urnas, Conte, presidente do partido antissistema, evitou falar em “derrota” e disse que os resultados desta segunda “confirmam o enorme potencial” da sigla e a “perspectiva séria de trabalhar com as forças progressistas”, em referência às bem-sucedidas alianças com a centro-esquerda em Bolonha e Nápoles.

“Eu havia dito que colocaria a cara a tapa e vou colocar. Esse é o tempo da semeadura para o M5S, acabamos de começar um novo percurso”, declarou o ex-premiê, que foi eleito presidente do movimento em agosto passado.

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