Catolicismo Romano

ANÁLISE: Especialistas dizem que novo Papa deve emergir de corrente conservadora

O sucessor de Bento XVI deve emergir da corrente conservadora da Igreja Católica, acreditam especialistas no assunto.

O novo Papa será escolhido durante um conclave que começa na próxima terça-feira (12) – reunião secreta na qual 115 cardeais eleitores definirão quem será o futuro pontífice. Entre eles, 67 foram indicados pelo próprio Bento XVI nos últimos oito anos.

Como a grande maioria dos cardeais é de conservadores e são eles que vão escolher o novo chefe da Igreja, é natural que o futuro Papa também tenha uma postura menos ousada com relação a grandes mudanças, dizem os estudiosos.

Contudo, os especialistas acreditam que a diferenciação entre progressistas e conservadores está obsoleta. Enquanto alguns deles preferem utilizar uma nomenclatura distinta, outros optaram por simplesmente não nomear as diferentes tendências.

Além disso, eles ressaltam que alguns cardeais, principalmente os que ocupam cargos de liderança, transitam entre as duas principais tendências com relação a determinados temas, por exemplo, o celibato e o divórcio. “Há sempre certa maleabilidade não dá para encaixá-los 100% nesta ou naquela tendência", diz o Padre Luiz Corrêa Lima.

A primeira grande corrente é a progressista, chamada de modernizadora pelo professor Francisco Borba, coordenador do núcleo de fé e cultura da PUC-SP. “Esse grupo se caracteriza por acreditar que a Igreja deve moldar-se às demandas da modernidade em relação à moral sexual, a organização interna e ao compromisso político-ideológico”, explica.

Os religiosos identificados com esse grupo em geral têm uma visão mais liberal com relação ao uso de preservativo, homossexualidade, divórcio, celibato, ordenação de mulheres, entre outras questões colocadas pela sociedade moderna.

Já o Padre Luiz Corrêa prefere chamar a corrente progressista de “tendência de centro-esquerda”. Para ele, esse segmento tem grande apreço pelas pastorais sociais e é mais voltado para a transformação social e movimentos populares. São associações religiosas como as comunidades eclesiais de base e os grupos “Fé e Política”, “Católicas pelo Direito de Decidir”, “Nós somos igreja.

“São grupos mais próximos da Teologia da Libertação [movimento que interpreta os ensinamentos de Jesus frente à libertação das injustiças socioeconômicas], que tem certo engajamento social e uma postura política de centro-esquerda”, esclarece Corrêa.

Apesar de numerosos, os progressistas não têm representatividade entre os cardeais que elegerão o novo Papa, acreditam os estudiosos. “O maior problema dos modernizadores [progressistas] é que não estamos mais na modernidade, mas na pós-modernidade. Enquanto esse grupo conclama os valores da modernidade dentro da Igreja, o próprio mundo laico questiona a importância desses temas, por exemplo, a imagem idealizada de total liberação sexual que parecia ser o melhor nos anos 70 e hoje já é questionada”, ressalta o professor Francisco Borba.

Para Padre Luiz Corrêa, as diferenças entre a tendência de centro-esquerda e os conservadores já foi mais nítida. “Nos anos 70, os termos direita e esquerda eram mais bem definidos. Depois da queda do muro de Berlim [1989] ficou tudo mais ou menos misturado”, afirma.

Avesso a definir nomenclaturas, o Padre Agenor Brighenti, da PUC-PR, divide os progressistas em dois segmentos, mas evita cunhar um termo para classificá-los. O estudioso caracteriza o primeiro segmento pela busca no tempo presente de soluções para as questões colocadas pela modernidade.

“Ao invés de apostar nas respostas de um passado sem retorno, [o grupo] busca viver o presente, ser feliz hoje, quase que reduzindo salvação à prosperidade material, saúde física e realização afetiva, numa espécie de religião do corpo”, afirma. De acordo com ele, esse segmento está caracterizado por métodos e práticas que lembram a corte pentecostal.

A segunda tendência com aspectos progressistas citada por Brighenti distingue-se da primeira pela "perspectiva libertadora e profética frente às situações sociais de injustiça e exclusão". O grupo aposta nas mudanças iniciadas no Concílio Vaticano II e defende a tradição latino-americana, tecida em torno da Conferência de Medellín — segundo encontro geral dos bispos da América Latina, realizado em 1968, que contou com a presença do Papa Paulo VI e teve como objetivo implantar as diretrizes do Vaticano II no continente.

Corrente dominante no conclave, os conservadores são um grupo menos ávido por mudanças. “Estão situados mais à direita. São mais conservadores com relação à moral sexual e preferem não se envolver tanto com os movimentos sociais. Eles não têm essa ênfase no conflito social”, explica o Padre Corrêa Lima.

O professor Francisco Borba, por sua vez, prefere chamar a corrente de renovadora. “Eles pregam que a Igreja deve dialogar com a modernidade, mantendo-se fiel às tradições. Defendem um retorno às raízes da experiência cristã para descobrir as respostas para as questões colocadas pela modernidade. Respostas que podem concordar ou não com aquilo que a sociedade laica anseia”, explica o estudioso.

Embora evite cunhar o termo conservador, o Padre Brighenti descreve um grupo dentro da Igreja que busca respostas nas tradições. “Há um segmento de católicos que, diante da crise atual [modernidade], da emergência de desafios desconcertantes e da exigência de dar novas respostas às novas perguntas […] busca agarrar-se em algo seguro, fazendo do passado um refúgio. Coloca a segurança na tradição, na doutrina, nas regras, numa espécie de entrincheiramento indentitário, com traços fundamentalistas”, analisa.

Há ainda uma terceira corrente que hoje tem pouco espaço dentro da Igreja: os chamados ultraconservadores ou tradicionalistas. São religiosos dissidentes do Concílio Vaticano II — encontro de bispos na década de 1960 que discutiu os novos rumos da Igreja Católica.

De acordo com os estudiosos, essa corrente não conta com representantes entre os cardeais que participarão do conclave. “Os membros desse grupo, que praticamente deixou de existir, pregam que a Igreja era melhor antes do Concílio Vaticano II. Eles preferem aspectos anteriores ao encontro, por exemplo, o retorno da missa rezada em latim”, explica o professor Francisco Borba.

A maior parte dos religiosos ultraconservadores deixou a Igreja Católica após o concílio, sendo que uma parte deles retornou após abandonar o radicalismo, fundando grupos como os “Arautos do Evangelho”, enquanto outros segmentos ainda não reataram com a Igreja.

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