
Fonte: Chiesa e Post Concílio – Tradução: Dominus Est
Evitando um futuro sem padres
A Igreja Católica tem um problema com padres. Um problema grave. Não do tipo que se lê nas manchetes dos jornais, mas que se vê nos seminários vazios. Do tipo que emerge das estatísticas e faz as autoridades do Vaticano suarem sob suas vestes.
Nos últimos 50 anos, os Estados Unidos perderam 40% de seus padres. A França ordena menos homens a cada ano do que a maioria das periferias produz formandos. Os seminários alemães permanecem praticamente vazios. A Irlanda luta para preencher uma única turma de seminário. A mesma instituição que sobreviveu à perseguição romana, às invasões bárbaras e a duas guerras mundiais é incapaz de convencer jovens a se tornarem padres. Algo fundamental foi rompido
A entropia espiritual não está apenas fora da Igreja, mas também dentro do presbitério. Os padres modernos passam mais tempo em reuniões de comitês do que em oração. Passam mais tempo se preocupando com os orçamentos da paroquia do que com as almas. Eles trocam a linguagem do pecado e da salvação por uma linguagem insípida de “jornadas” e “experiências vividas”. O sacerdócio foi despojado de tudo o que o tornava atraente para homens corajosos. Os primeiros sacerdotes da Igreja enfrentaram os leões, literalmente. Eles foram apedrejados, decapitados e queimados vivos. Eles sabiam que seu compromisso poderia matá-los. Mesmo assim, eles o aceitavam. Os padres de hoje enfrentam reuniões de conselhos paroquiais e comissões de planejamento litúrgico. Longe de serem guerreiros, eles são gerentes de nível intermediário. Administradores, não heróis.
Nenhum jovem sonha em presidir uma noite de bingo. Ele sonha em matar dragões. Quando esse sonho desaparece, o chamado também desaparece. Se isso soa duro, ótimo. Realmente deve ser assim. Porque se a Igreja prosperasse, eu não precisaria escrever isto.
Uma das razões mais profundas e menos reconhecidas pelas quais os jovens fogem do sacerdócio é essa: ele foi feminizado de todas as maneiras erradas e permaneceu masculino de todas as maneiras erradas. Deixe-me explicar. Um chamado que antes exigia previsão e coragem foi transformado em algo mórbido, burocrático e vagamente apologético. Cada sermão agora precisa ser uma conversa gentil. Cada afirmação, um jogo de equilíbrio. O diálogo substitui a declaração. A ofensa é tratada como heresia. O Evangelho é filtrado por uma linguagem terapêutica e por um jargão de RH até atingir a clareza moral de um chá morno requentado.
Mas, enquanto a mensagem se torna mais delicada, a estrutura permanece rígida. Celibato? Ainda é obrigatório. Casamento? Fora de questão. Tem-se os ossos do antigo sacrifício, mas nada do espírito que outrora o tornou nobre. O pior dos dois mundos. Todo o custo da masculinidade tradicional sem a glória.
Os jovens percebem isso. Sentem profundamente a contradição. São instruídos a renunciar ao sexo, a paternidade e ao conforto de um parceiro — não pela emoção da guerra espiritual, não para oferecer o poderoso sacrifício do céu e da terra, não para batizar novas nações ou afrontar tiranos —, mas para participar de seminários diocesanos sobre diversidade e enviar e-mails com lembretes sobre as vendas dos quitutes da paróquia. Espera-se que se tornem pastores celibatários de um rebanho que preferiria que sorrissem mais e ficassem em silêncio. É como treinar para entrar nas Forças Armadas e ser designado para o atendimento ao cliente. “Parabéns, você completou a Semana Infernal. Aqui estão seus fones de ouvido: você terá que aceitar reclamações sobre as hóstias serem muito insípidas.” Enquanto isso, a Igreja continua a se perguntar para onde foram todos aqueles guerreiros.
O espírito masculino não está morto. Não mesmo. Ele apenas foi insultado.
Se for pedido a um homem que sacrifique tudo – seu corpo, seu futuro, seu legado —, então é melhor confiar-lhe uma missão que justifique esse sacrifício. A Igreja primitiva entendia isso, assim como a Igreja de todas as eras anteriores à nossa. Ela não tolerava simplesmente a energia masculina. Ela a exigia. Os santos não evitavam o perigo. Eles corriam em sua direção. O sacerdócio não era um papel. Era um lugar nas trincheiras.
Homens de verdade não temem regras e nem sacrifícios. O que eles não suportam é a hipocrisia. O que eles abominam é uma estrutura que exige uma heroica moderação enquanto recompensa um conformismo covarde. Eles precisam de clareza. Precisam de postos para subir, missões para cumprir, uma fraternidade à qual pertencer. A tragédia é que a Igreja já tem tudo isso. Ela simplesmente se esqueceu de como apresentá-lo (e alguns de seus líderes deixaram de acreditar nisso). E os homens — especialmente aqueles que antes iam caminhado descalços para o martírio — entenderam a mensagem. Esses estão indo embora.
Antes de prosseguir, gostaria de salientar que o celibato em si não é o problema. Alguns dizem que se livrarem dessa regra, de repente os seminários ficarão lotados. Como se os jovens estivessem batendo de porta em porta, desesperados para servir, mas desencorajados pelas pequenas cláusulas sobre sexo. Por favor. Essa fantasia se baseia em uma premissa falha, que não se sustenta mais. Ela pressupõe que o sexo ainda é tão importante quanto era no passado. Que os jovens estão sedentos por prazer físico, que o eros ainda é uma força dominante que molda vidas.
Não vivemos mais nesse mundo. Estamos vivenciando uma recessão sexual. E não me refiro a monges e aspirantes a místicos. Refiro-me a todos. De acordo com dados concretos, mais de um em cada quatro homens com menos de 30 anos não fez sexo no último ano. Um número cada vez maior de jovens nunca fez sexo. Não porque sejam disciplinados. Não porque sejam devotados a coisas mais elevadas. Mas porque o mundo moderno tornou o sexo chato, constrangedor, vergonhoso — ou pior, sem sentido. O que antes era sinônimo de conexão foi transformado em mercadoria. Simulado pela pornografia e banalizado por aplicativos.
Para muitos jovens, o próprio desejo se extinguiu. O fogo se apagou. E isso é assustador — para a sociedade, sim, à medida que ela recua em direção ao despovoamento. Mas para a Igreja, sugiro, também é uma oportunidade. Quer falar sobre recrutamento? Vamos começar por aí. Não eliminando o celibato, mas reformulando-o. Permitimos que o mundo definisse o celibato como privação. Como um compromisso estéril. Como o triste compromisso imposto pelos socialmente desajeitados. E nós concordamos com isso, desculpando-nos até o fim. Não é de se admirar que ninguém se inscreva.
Mas celibato não é fraqueza. Não é terapia. É guerra.
Ou pelo menos costumava ser. A Igreja primitiva não considerava o celibato uma nota de rodapé trágica. Ela o via como um fogo. Um sacerdote não era um homem que evitava o sexo: ele era um homem consumido por algo muito maior: obsessão divina, um propósito único e a clareza da eternidade.
Hoje, promovemos o celibato como um troféu de participação para os emocionalmente abalados. Como se o sacerdócio fosse o último refúgio para homens que não conseguiram sucesso no mundo real. Pedimos que renunciem à família e aos filhos, e o que lhes oferecemos? Solidão? Não. O celibato deve ser concebido como uma libertação para a conquista. Como uma vida livre de apetites. Não repressão, mas consagração. Um homem tão ligado ao eterno que os apegos terrenos se dissipam como pó.
A vida celibatária não é vazia, é focada. É perigosa. É estimulante. Esse é o paradoxo que devemos confrontar: a geração assexuada não é uma maldição. É uma porta. Se o sexo não é mais uma tentação, então não é mais um obstáculo. O que resta é um vazio de desejo — e a Igreja deve preenchê-lo, não com um dedo em riste, não com terapia — mas com fogo. Reacenda-o ou perca-o para sempre.
Reformular o celibato como um superpoder é um começo. Mas se esse voto não estiver consagrado em algo de tirar o fôlego, algo tão cheio de admiração que te abale até a alma, todo o esforço será em vão. Disciplina sem visão é crueldade. Pode-se impor sacrifícios, mas se não houver glória visível — nenhum sentimento de que o que você está construindo vai além do túmulo – então você estará apenas exaurindo as pessoas.
Os homens, acima de tudo, não reagem a ideais vagas. Eles precisam ver alguma coisa. Não basta dizer que é sagrado. É preciso que pareça, sinta e cheire a sagrado. Eles precisam da presença de algo de outro mundo, algo que diga: “Isso é importante”.
É aqui que entra a beleza. E não o tipo esterilizado que circula nas conferências episcopais. Estou me referindo ao tipo de beleza que nos deixa completamente sem palavras. Que interrompe qualquer conversa. Que o lembra de que está em um lugar destinado a ressuscitar os mortos. Uma beleza que faz o que os catecismos sozinhos nunca podem fazer: revelar Deus.
A Igreja sempre compreendeu isso. Nunca foi motivo de debate. Não havia necessidade de um teólogo explicar a doutrina da Presença Real quando se via manifesta na forma como o próprio edifício se curvava em torno do altar. A própria estrutura já dizia isso. A altura do teto, a luz que incidia sobre o cálice, as sombras dançando sob os vitrais, até mesmo o silêncio penetrante: tudo dizia muito.
Esta era a glória da Igreja pré-moderna: ensinava por meio da arquitetura, do peso, do eco e da escala. Formava os homens não apenas intelectualmente, mas também fisicamente, atraindo seus olhos para o alto, seus joelhos para baixo e suas almas para além de si mesmas. Cada centímetro do santuário era um mapa para a eternidade. E tudo isso dizia uma coisa: isto não é deste mundo.
Mas o clero moderno não gostou disso. Eles queriam conforto e acessibilidade. Herdaram prédios que fariam homens adultos chorarem e os substituíram por paredes brancas e telas retráteis. A beleza cedeu à otimização. Não era mais eficiente. E assim, eles a erradicaram. O latim foi descartado como amianto. O canto foi ridicularizado como uma relíquia. Ícones foram derrubados e substituídos por clipart. Altares de mármore foram substituídos por mesas que podiam ser estendidas para um café da manhã dos Cavaleiros de Colombo. Tabernáculos foram exilados para capelas laterais como se o Santíssimo Sacramento fosse um risco de incêndio.
E os padres, muitos ainda usando colarinhos romanos, ficaram sobre os escombros e chamaram isso de progresso. O que preencheu o vazio? O bege. Literalmente e espiritualmente. Paramentos bege. Música bege. Teologia bege. Sentimentos bege disfarçados de sermões.
Tudo na nova estética da igreja contradiz a beleza. Ao entrar na maioria das paróquias católicas hoje em dia, você se pergunta se Deus foi embora e se esqueceu de apagar as luzes. Luzes fluorescentes agressivas. Carpetes surrados. Objetos de feltro nas paredes. Um crucifixo pendurado como um sinal de segurança esquecido. Nada se move. Nada obriga. Nada prende. E nos perguntamos por que os jovens não ficam. Por que deveriam?
A beleza não é uma estratégia de marketing. Não é decorativa. Não é opcional. Não é para artistas. É essencial. A beleza ensina. Ela questiona. Ela revela a forma da verdade antes mesmo que as palavras cheguem ao cérebro. Ela ignora argumentos e atinge o coração. Ela faz o que a doutrina por si só não pode fazer: enraíza a fé. Ela batiza a imaginação. Torna o abstrato insuportável de ser ignorado. Até mesmo camponeses medievais, analfabetos e exaustos, entendiam o significado da beleza. Eles não conseguiam ler o Catecismo, mas viam o sagrado. Eles o viam na Missa, nas velas e no ouro que cobria o missal. Eles eram pobres, mas suas igrejas não eram porque acreditavam que Deus merecia algo melhor do que eles.
Em algum momento parou-se de acreditar.
Nos últimos anos, em sua tentativa desesperada de parecer moderna, a Igreja Católica se jogou aos pés do Vale do Silício. Ela quer parecer atual, útil, acessível — tudo, menos ser antiquada. E assim, como qualquer instituição decadente que perdeu a fé em sua missão, ela se agarra à relevância como um bêbado agarrado ao volante. Ela se baseia em branding, “alcance digital“, algoritmos, métricas de engajamento e estratégias de conteúdo. A mesma linguagem usada para vender sapatos, xampu e serviços de streaming agora está sendo empregada para “difundir o Evangelho”.
O que isso produz? Padres do TikTok cantando hinos em playback. Bispos fazendo podcasts como coaches de vida. Sermões reduzidos a 90 segundos com legendas excêntricas e riffs de violão acústico. Vídeos de Adoração Eucarística de baixa fidelidade repletos de hashtags como #abençoado e #vibraçõesespirituais. Confissão transformada em uma experiência “drive-through“[como comprar produtos sem sair do carro -ndT]. Influencers de rosários com árvores de links e códigos de produtos.
Isso não passa de uma submissão descarada. Uma rendição estratégica, disfarçada de modelos do Canva. E, pior ainda, é ineficaz.
Porque não se pode vencer o Vale do Silício em seu próprio jogo. Não se pode vencer o algoritmo em termos de cliques, elogios ou choque. Nunca serão mais inspiradores que o TikTok. Nunca serão mais reconfortantes que um psicólogo do YouTube. Nunca serão mais “relevantes” do que qualquer tendência secular que esteja viralizando nesta semana. [Não é ruim que a Igreja esteja lá; mas, à sua maneira, e não na moda ou mercantilizando -ndT].
E não se deveria provar. Porque o que a Igreja defende não é “conteúdo”. É contato. Contato com algo sagrado e santo. Não tranquilizador. Não seguro. Algo que não requer o seu envolvimento, mas a sua transformação. Quando você reduz tudo isso a uma estratégia de mídia social — quando se edita, marca, reduz, mercantiliza — não a torna mais acessível. Faze-a desaparecer.
A Igreja não deve competir no mercado por atenção. Ela deve permanecer fora dele: distante, intocável, autêntica. Quando tudo o mais é entretenimento, a Igreja deve ser confrontação. Quando tudo o mais diz: “Você basta a si memso“, a Igreja deve sussurrar: “Você é pó“.
Foi isso que a tornou poderosa. Foi isso que a tornou aterrorizante. Foi por isso que costumava mudar vidas. Mas agora ela luta por migalhas em plataformas projetadas para apagar memórias, tentando viralizar por um Evangelho que não deveria se conformar a um ciclo de tendências e buscando a aprovação da juventude com truques digitais em vez de exigir obediência por meio do mistério sagrado.
A internet já tem seus artistas. Já tem influencers. Já tem psicoterapeutas, gurus espirituais e palestrantes motivacionais. O que ela não tem são sacerdotes. Não os verdadeiros. Porque padres de verdade não dançam para ter seguidores. Eles não twitam para obter validação. Eles não resumem a liturgia em vídeos. Eles não decompõem a Missa em conteúdo. Eles desaparecem nela.
Um verdadeiro padre não se parece com alguém que você pode “seguir” numa tela. Ele se parece com alguém que viu algo que você não viu. Ele se move em um mundo marcado. Separado. Diferente. Ele deveria ser estranho, no bom sentido. Ele deveria chocar o ambiente só de entrar. Na minha opinião, foi isso que perdemos completamente. A sensação de que os padres são diferentes. Não melhores que os leigos, mas diferentes. Chamados para algo que exige uma reordenação fundamental de prioridades, desejos e vida cotidiana. Em vez disso, nós os tornamos acessíveis. Compreensíveis. “Exatamente como nós, mas com um colarinho.” Nós os despojamos de seu mistério e nos perguntamos por que sua aura desapareceu. Nós os tornamos amigáveis e acessíveis, apenas para fingir ficarmos chocados quando os jovens não veem nada pelo qual valha a pena se sacrificar.
O problema é mais profundo do que estratégias de recrutamento ou reformas de seminários. Ele diz respeito ao cerne do que achamos que o sacerdócio precisa. Se os padres são apenas facilitadores terapêuticos com autoridade sacramental, então, francamente, não precisamos de tantos deles. Alguns assistentes sociais com o poder de consagrar o pão seriam suficientes. Mas se os sacerdotes são pontes entre o céu e a terra, se eles devem ser lembretes ambulantes da existência de outro mundo, se eles devem exalar o aroma da eternidade e se mover como homens que tocaram o divino, então devemos começar a nos comportar de acordo.
Precisamos parar de dar desculpas para a estranheza do chamado e começar a celebrá-lo. Precisamos parar de inventar desculpas para o celibato e começar a apresentá-lo como ele é: um testemunho radical da primazia do eterno sobre o temporal. Acima de tudo, precisamos parar de tentar tornar o sacerdócio atraente para todos e começar a torná-lo atraente para os homens certos. Homens que não querem um emprego, querem uma missão. Homens que não querem conforto, querem realização. Homens que não querem se encaixar, querem se destacar por algo que importa.
Esses homens ainda existem. Eles não navegam por sites de seminários em busca de orientação profissional. Eles não se impressionam com campanhas de conscientização digital ou iniciativas de diversidade. Eles estão procurando por algo real. Algo perigoso. Algo pelo qual vale a pena morrer. E quando encontrarem isso – quando encontrarem uma Igreja que acredita em sua mensagem o suficiente para exigir sacrifício, que aprecia a beleza o suficiente para se cercar dela, que leva o sacerdócio a sério o suficiente para torná-lo aterrorizante e irresistível – eles não precisarão ser recrutados. Eles virão correndo.
Portanto, sim, vamos tornar o sacerdócio grande novamente. Para isso, no entanto, precisamos fazer com que os sacerdotes brilhem com algo que o mundo não compreende completamente. Quando isso acontecer, não haverá necessidade de uma campanha digital. Porque os homens não rolarão mais as páginas. Eles se aproximarão do altar de Deus, do Deus que alegra a juventude deles.