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Entenda a crise bancária italiana que pode chacoalhar a União Europeia

Muito se falou nos últimos meses sobre os efeitos danosos que a saída do Reino Unido da União Europeia poderia causar na economia, mas bastou que o referendo britânico passasse para que a Europa percebesse que seu maior problema financeiro está em outro lugar: na Itália. Há anos que os bancos do país enfrentam dificuldades.

Até agora, pouco foi feito para salvá-los. Embora as autoridades neguem a existência de uma crise no sistema bancário italiano, o fato é que são cada vez maiores os temores de que a bomba possa explodir em breve, contaminando toda a zona do euro.

Mas qual é o problema, afinal?
– Os bancos italianos estão no centro das atenções dos mercados globais por causa do alto nível de créditos deteriorados em suas carteiras. Calcula-se que esses empréstimos, que dificilmente serão pagos, totalizem 360 bilhões de euros, o equivalente a 17% do total de créditos concedidos no país, uma das taxas mais altas da UE – na Alemanha, esse índice é de 3,4%. A elevada parcela desses títulos tóxicos (cinco vezes maior que antes da crise) impede que os bancos aprovem novos financiamentos, freando a retomada da economia italiana. O Monte dei Paschi di Siena (MPS) – tido como o banco mais antigo ainda em atividade no mundo -, por exemplo, tem um terço de sua carteira tomada por créditos deteriorados.

E por que tantos créditos deteriorados? – Essa pergunta tem muitas respostas, a começar pela própria crise financeira que atinge a Itália desde 2008. Com a piora do cenário econômico e o crescimento galopante do desemprego, muitas pessoas e empresas não conseguiram mais pagar as prestações dos empréstimos tomados, aumentando a inadimplência. No entanto, também são frutos de atitudes negligentes por parte dos dirigentes bancários. O sistema italiano é bastante pulverizado, com uma miríade de bancos que sempre usaram a amizade para fazer negócios. Era comum emprestar a pessoas, empresas e políticos próximos quantias vultosas que dificilmente seriam restituídas.

O que já foi feito para solucionar o problema? – No fim do ano passado, o governo do primeiro-ministro Matteo Renzi aprovou um decreto para salvar da falência quatro bancos de pequeno porte: Etruria, Carichieti, Marche e Cassa di Risparmio di Ferrara.

A medida evitou a quebra das entidades por meio do chamado "bail-in", quando o salvamento é feito com dinheiro dos próprios investidores e acionistas. Com o decreto, o governo substituiu os bancos por quatro novas companhias, contendo apenas os ativos "saudáveis". Os papéis deteriorados foram transferidos a uma nova sociedade, um "bad bank" que funciona como uma espécie de "lixeira" e existe apenas para abrigar os prejuízos e tentar vender os créditos podres a fundos especializados em recuperar parte dos investimentos. 

Nessa operação, nenhuma pessoa que era apenas correntista ou havia investido suas economias em produtos financeiros ordinários perdeu dinheiro. Só ficou no prejuízo quem aplicou em ações dos bancos ou nas chamadas "obrigações subordinadas", ativos de alto risco que, em caso de insolvência, só são pagos depois de todos os outros créditos devidos pela instituição.

As consequências – Em um mundo ideal, o "bail-in" faz com que as operações de resgate dos bancos sejam pagas apenas por acionistas ou por quem apostou na sua solidez comprando as "obrigações subordinadas". Em 2013, quando foi introduzido na legislação italiana, esse modelo de salvamento não sofreu resistência.

Foi a quebra dos bancos Etruria, Carichieti, Marche e Cassa di Risparmio di Ferrara que expôs o grande problema do "bail-in": ao contrário do recomendável, as "obrigações subordinadas" foram vendidas pelas instituições financeiras em larga escala a cidadãos comuns, aposentados e poupadores, gente sem o conhecimento necessário para avaliar corretamente o risco do investimento. 
Segundo a revista "The Economist", cerca de 200 bilhões de euros em "obrigações subordinadas" estão nas mãos de pequenos investidores. A publicação lembra que obrigar pessoas normais a pagarem o preço por novos resgates prejudicaria a imagem de Renzi, às vésperas do referendo constitucional que definirá seu futuro.

O que fazer, então? – A Itália tenta obter da União Europeia a possibilidade de salvar bancos injetando dinheiro público, algo que já foi duramente rechaçado pela chanceler da Alemanha, Angela Merkel, embora a Comissão Europeia, poder Executivo do bloco, pareça mais aberta à ideia.

"Os bancos em toda a UE atravessam momentos difíceis, e é importante que ao usar as regras aprovadas por todos elas sejam adaptadas a cada país", afirmou a comissária para Concorrência do bloco, Margrethe Vestager. Ainda assim, se Bruxelas autorizar uma recapitalização estatal, ainda é incerto quanto dinheiro seria necessário na operação – um montante muito elevado também poderia desestabilizar o governo. A situação deve ficar mais clara em 29 de julho, quando a União Europeia deve divulgar os resultados de uma nova rodada de testes de estresse nos bancos. (Ansa)

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